Arquivo publicado na Revista Veja
Entrevista: Paulo de Tarso Lima
Postado em 09/06/2010
Não é habitual ouvir um médico respeitável, de uma
instituição de saúde modelar, falar sobre o papel da energia do corpo humano e
da religião no caminho para a cura. É justamente o caso do cirurgião Paulo de
Tarso Lima, coordenador do Departamento de Medicina Integrativa e Complementar
do Hospital Albert Einstein, de São Paulo.
A medicina integrativa é uma prática em ascensão. Surgida
nos Estados Unidos na década de 1970, une a medicina tradicional oriental, com
sua abordagem holística, e a ocidental, apoiada na produção científica e na
tecnologia. A reunião tem revolucionado a busca pela cura de doenças como o
câncer. "A idéia não é excluir nada, mas juntar tudo e mostrar que a
pessoa é detentora da capacidade de cura da própria doença", afirma Lima,
que estudou a medicina integrativa na Universidade do Arizona (EUA) e cursa o
primeiro ano da Barbara Brenner School of Healing, na Flórida, onde a cura é
perseguida a partir do estudo da energia humana.
O médico é também autor do livro Medicina Integrativa
- A Cura pelo Equilíbrio. Na entrevista a seguir, ele explica os fundamentos da
medicina integrativa e aposta que a prática vai se espalhar por aqui por razões
econômicas - por ora, apenas alguns hospitais e somente cinco universidades
brasileiros se dedicam ao assunto.
Afinal, o
que é medicina integrativa?
É um movimento que surgiu nos Estados Unidos na década
de 1970 e que começou a ser organizado com mais rigor na década de 1980, quando
entrou para as faculdades de medicina. Hoje, existem 44 universidades
americanas ligadas à pratica, que traz uma visão mais holística da pessoa no
seu todo: corpo, mente e espírito. O que buscamos é oferecer uma assistência
com informação e terapias que vão além da medicina convencional para ajudá-la a
se conectar com a promoção de saúde. Eu não tenho a menor dúvida de que a
medicina convencional é extremamente efetiva em se tratando de doença, mas
saúde não é apenas ausência de doença.
Que terapias
são essas?
Sistemas tradicionais como a medicina chinesa e
indiana nos oferecem uma gama de alternativas, como acupuntura, Reiki, yoga,
entre outras, que trabalham a energia do nosso corpo, estimulando uma reação
aos sintomas das doenças. A idéia desse movimento não é excluir nada, mas
juntar tudo e mostrar que a pessoa é detentora da capacidade de cura da própria
doença. Isso é uma mudança de paradigma, porque a possibilidade de voltar ao
estado saudável não é algo dado à pessoa, mas é algo inato a ela.
Qual a
explicação para só agora a medicina integrativa despertar interesse de médicos
convencionais?
Há duas razões: a demanda dos pacientes e a produção
acadêmica, que cresce a uma velocidade muito alta. Se entendemos como as coisas
funcionam, sabemos que é seguro.
Qual a
situação da prática no Brasil?
Estamos em uma situação de dualidade. Os alinhados à
prática muitas vezes não usam a medicina convencional de maneira integrada, e
os convencionais não usam a medicina integrativa. Temos no Brasil um movimento
diferente dos Estados Unidos, menos acadêmico, mas que vem crescendo graças a
uma portaria de 2006 que autorizou procedimentos de acupuntura, homeopatia, uso
de plantas medicinais e fitoterapias no Sistema Único de Saúde (SUS).
E por que a
resistência dos médicos convencionais?
Eu não entendo. Estamos falando de energia e não
precisamos ir muito longe para provar que energia corporal existe. A partir do
momento que temos uma mitocôndria que produz energia dentro de cada célula, e
isso é ensinado no primeiro ano de medicina, não há o que discutir. Temos
energia no corpo, e pronto. O curioso é que muitos exames hospitalares
rotineiros são baseados em mensuração do campo energético do corpo, como a
ressonância magnética, o eletroencefalograma e outros mais sofisticados. Mas se
você falar para um neurologista sobre a manipulação da energia do corpo, ele
pira.
Por quê?
Porque entramos em um outro ponto da discussão sobre a
energia humana, que é a interface com a religião. Estamos vivendo em uma nova
fronteira em que se tenta entender essa energia, como ela é produzida, como
pode ser manipulada e conduzida. E isso tem um impacto importante na questão da
espiritualidade. Por isso, se algum paciente meu acha conforto na religião, se
ele se sente bem assim, eu o estimulo a praticá-la.
E como se
medem os resultados da medicina integrativa?
Começamos a medir os resultados pelas questões
econômicas. A Prefeitura de Campinas, em São Paulo, registrou uma redução substancial de
uso de analgésico dentro do SUS ao oferecer terapias ligadas à medicina chinesa
focadas na questão ósseo-muscular. Além disso, tem uma série de trabalhos
acadêmicos ligados à genética provando que a qualidade de vida produz efeitos
na expressão genética da doença. E uma nova fase de trabalho investiga se uma
gestante, cujo feto apresenta uma expressão genética de determinada doença,
pode ajudar seu bebê se tiver uma gestação muito cuidadosa.
Como isso
seria possível?
O homem carrega no seu código genético informações de
doenças que podem ser a causa de sua morte. Isso já é provado. Só que você pode
ter a característica genética da doença e não desenvolvê-la, ou tê-la
precocemente. Isso vai depender da qualidade da sua vida. Comer bem, respirar
melhor, praticar atividades físicas, lúdicas e contemplativas são fatores muito
importantes ligados à qualidade de vida e que vão provocar um impacto no nosso
bem-estar e, consequentemente, na resposta do corpo às doenças já estabelecidas
e àquelas que estão programadas para acontecer. O Prêmio Nobel do ano passado
de Medicina (dividido entre os pesquisadores Elizabeth H. Blackburn, Carol W.
Greider e Jack W. Szostak) mostra que, se há uma importante mudança nutricional
e de práticas contemplativas, há uma diminuição da expressão de câncer de
próstata em determinados grupos de homens.
As pessoas,
em geral, estão mais abertas para as práticas alternativas?
No Brasil, entre 45% e 80% dos pacientes
diagnosticados com câncer utilizam algum tipo de terapia
"alternativa" em conjunto com o tratamento. Nos Estados Unidos, 13%
das crianças e 55% dos adultos saudáveis utilizam tais práticas.
O senhor
acredita que essa corrente ganhará espaço no futuro?
Acredito. Não por razões humanitárias, mas por uma
questão econômica. Afinal, a forma como a medicina é praticada atualmente
implica altos custos. Não posso prever, porém, quanto tempo isso vai demorar,
porque o convencimento dos profissionais a respeito do assunto exigirá um longo
trabalho.